lunes, 5 de diciembre de 2016

ESCAPARATE POÉTICO (XCI) João Pedro Mésseder







                                JOÃO  PEDRO  MÉSSEDER  (Porto, 1957)




1936 – 1939



Há um azul cruel
sobre os campos
de Castela,
João Pedro Mésseder
um azul que não cala
o seu lutuoso silêncio,
porque o vermelho
derramado há tantos anos
não fez desse azul
o seu espelho:
apenas se infiltrou
na terra ardente.
E a tingiu
ainda mais
da cor da carne.




DE UMA CANÇÃO  PERDIDA – ESTILHAÇO


Un projéctil caiu na escola
outro caiu num quintal

outro explodiu no mercado
outro ainda no hospital



MÍSSIL


Dentro de minutos
com estrondo
vai cair.

Quantos meninos
neste instante
ainda
estão a rir?




ERA JULHO


Era julo, o mês dos gritos
e das noites assombradas.

E eu sonhava que em Gaz
o sangue das crianças
das mulheres e dos homens
escorria para o mar

e as ondas
se tingiam de vermelho.

E eu mesmo
de vermelho me tingia.



 
A  SUL DE CRETA


A esta hora, nas praias de Creta,
tomam-se banhos de mar e de sol.
Seiscentos quilómetros a sul
a vida vale o mesmo
que um grão de areia no deserto.




(Do libro Lá  longe o fogo, editado por Página a Página- Divulgação do Livro, SA. 2015)